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O EMPREGO DAS PLANTAS AROMÁTICAS DESDE AS
ANTIGAS CIVILIZAÇÕES ATÉ AO PRESENTE
Prof. A. Proença da Cunha email:-pdacunha@ci.uc.pt - site: http://antoniopcunha.com.sapo.pt
1 - POVOS PRIMITIVOS
Desde os primórdios da humanidade, que a maioria dos historiadores
reportam ao Paleolítico, o primeiro dos três períodos em que se subdivide a
idade da pedra lascada, o homem sempre dependeu das plantas para a sua
existência, ao utilizá-las como alimento, medicamento, construção de
abrigo, no aquecimento, etc.
Por comparação com outras sociedades sem escrita que existem na
actualidade, pode-se inferir de como seriam esses povos primitivos onde
crenças e ritos mágicos imperavam a par da utilização das plantas. As
plantas aromáticas rapidamente foram associadas aos rituais sagrados
essencialmente devido à intensificação do seu odor ao serem queimadas.
Com efeito, os primeiros habitantes do planeta queimavam plantas de
odor agradável para pedir protecção aos bons Deuses, constituindo, as de
perfume desagradável, um meio de afugentar os animais, os inimigos ou
para afastar os Deuses maléficos. Aos aromas, sempre foi associada a ideia
de purificação. As plantas aromáticas empregues como oferendas, sempre
serviram para relacionar o homem com os Deuses, particularmente em
momentos difíceis e perigosos, como o nascimento, uma viagem, uma
guerra ou até mesmo na morte.
O registo mais antigo que se conhece sobre a sua utilização, foi
encontrado num túmulo do Neolítico (entre 5000 e 2500 anos A.C.) no qual
se encontraram vestígios de um homem envolvido em plantas aromáticas,
identificadas por restos de grãos de pólen.
Estimado em cerca de 40000 anos a existência dos Aborígenes do
continente Australiano, estes, cedo se aperceberam da utilidade das plantas
aromáticas ricas em cineol, tais como os eucaliptos e as melaleucas, em
particular a Melaleuca alternifolia, motivo por que sempre as usaram,
vindo a terapêutica moderna a reconhecer o seu valor.
É interessante referir que, já 5000 anos antes da nossa época,
possivelmente se destilavam plantas aromáticas, pois no Paquistão foi
descoberto um alambique em terra cozida, que foi datado como sendo
desse período.
O nome “Perfume”, que está associado às plantas aromáticas, deriva
da palavra latina “per fumum” ou “pro fumum”, que significa “pelo fumo”,
o que vem demonstrar o modo mais antigo de aplicação das plantas
aromáticas, feito pela combustão desses materiais que assim criavam um
ambiente apropriado para uma dada cerimónia.
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Durante séculos, centenas de culturas desenvolveram actos
simbólicos e religiosos, onde plantas aromáticas raras e resinas aromáticas,
queimadas nos altares dos templos, eram oferecidas como sacrifícios, em
busca de favores dos Deuses. Com este objectivo eram utilizadas, entre
outras, o sândalo, a casca de canela, as raízes de cálamo, o cedro do
Líbano, bem como substâncias resinosas como a mirra, o incenso e o
benjoim.
Com o passar dos anos as plantas aromáticas passaram a fazer parte
de técnicas de prevenção e de tratamento das doenças, principalmente de
feridas e contusões, como mostram documentos chineses e indianos com
mais de 5000 anos.
2 - CIVILIZAÇÕES DO ORIENTE
A China e a Índia foram duas civilizações onde as plantas aromáticas
tiveram um grande emprego. Para além do seu uso na prevenção das
doenças por intermédio de fumigações, elas eram utilizadas como
medicamentos e, ainda hoje, a medicina chinesa as emprega com bons
resultados.
Na China estabeleceu-se um sistema terapêutico baseado
essencialmente em duas forças, o Yang e o Yng, inicialmente traduzindo o
claro e o escuro, mas depois alargado a todas as situações em que haja
sistemas que se opõem. No homem o equilíbrio entre essas duas forças
significa saúde, havendo doença quando há predomínio de uma sobre a
outra. Mais tarde, durante a dinastia Song (960-1279) foi aceite um outro
sistema, a dos cinco elementos (água, metal, terra, fogo e madeira) no qual
se enquadravam numerosos produtos vegetais (ópio, ruibarbo, canela, entre
outros), cuja acção estava relacionada com um dos cinco elementos.
Na medicina chinesa, é célebre a obra denominada Pent-Sao
constituída por vários livros onde existem referências a numerosas plantas,
muitas delas aromáticas e que ainda hoje são usadas com bons resultados.
O continente indiano é uma das regiões mais ricas em plantas
aromáticas. A Índia é o país onde o manjerico cresce espontâneo e onde é
considerado como sagrado. Há cerca de 3000 anos Rig-Véda e
Suçrutasamhitã indicaram numerosas fórmulas para banhos e massagens
onde entravam a canela, o cardamomo, o coentro, o gengibre, a mirra, entre
outras plantas aromáticas.
No mesmo período, a Índia tornou-se famosa pelo seu sândalo e por
uma variedade de flores como a rosa e o jasmim. A madeira de sândalo era
usada, normalmente, na entrada dos edifícios importantes, para que o vento
pudesse espalhar o seu perfume pelas salas.
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Desenvolvimento muito similar foi ocorrendo no Egipto.
No antigo Egipto faraónico a Mitologia estava presente nas relações
homem, doença e tratamentos. Thot era considerado como o deus fundador
da Medicina, tendo-a ensinado aos sacerdotes. A deusa Isis seria, para além
de protectora das mulheres e das crianças, também da cultura das plantas
medicinais e aromáticas.
Acreditava-se que a origem das doenças resultavam de castigos
enviados pelos deuses por faltas que o homem tinha cometido, pelo que
inicialmente a Medicina era exercida só pelos sacerdotes que tentavam
acalmar os deuses à custa de preces, sacrifícios e fórmulas mágicas onde
entrariam as plantas e outros produtos naturais. Posteriormente, dá-se uma
especialização em três grupos: o dos sacerdotes (Profetas e Pastoforos) que
estabeleciam a ligação entre os deuses e o doente, obtida com rituais
religiosos e administração de medicamentos; os médicos, não religiosos que
só administravam medicamentos; e os feiticeiros que utilizavam,
essencialmente, práticas sobrenaturais.
Registos do antigo Egipto com mais de 4500 anos A.C. já referem o
uso de substâncias balsâmicas, óleos perfumados, cascas e resinas
aromáticas, especiarias, bem como vinagres, vinhos e cervejas aromáticas
na medicina, liturgia, astrologia e embalsamamentos.
A tradução de hieróglifos inscritos em papiros e estelas no templo de
Edfu mostram que muitos produtos aromáticos eram usados pelos
sacerdotes e alquimistas para a preparação de perfumes, segundo fórmulas
próprias.
Num documento escrito, o famoso papiro decifrado em 1873 pelo
egiptólogo alemão Georg Ebers, existe a seguinte afirmação introdutória:
“Aqui começa o livro relativo à preparação dos remédios para todas as
partes do corpo humano”. Provou-se que o papiro de Ebers representa o
primeiro tratado médico egípcio conhecido, da primeira metade do século
XVI antes da era cristã, em que parte do seu texto, é destinado ao
tratamento das doenças internas e, a restante, dá indicações sobre a
constituição dos medicamentos a empregar, muitos dos quais são plantas
aromáticas.
Fragmento do papiro de Ebers
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Outros papiros foram descobertos e decifrados, tais como o de Edwin
Smith de 1550 A.C., o de Ramesseum elaborado por volta de 1900 A.C., o
de Londres composto por volta de 1350 A.C., e muitos outros, todos de um
modo geral incluindo indicações sobre o uso de plantas medicinais e
aromáticas em práticas médicas.
Embora a medicina egípcia se apoiasse, muito, em elementos mágicos
e religiosos, sabe-se que já eram utilizadas muitas plantas aromáticas, tais
como a angélica, a artemísia, o anis, a alcaravia, os cominhos, o funcho, a
verbena o zimbro, o almíscar, este, empregue primeiramente na medicina e
depois, em perfumes. A planta aromática camomila estava ligada ao deus
Sol, sendo usada no caso de febre ou de queimaduras solares.
No Egipto queimavam-se plantas aromáticas nos lares e cobria-se o
soalho com as suas folhas com o fim de perfumar o ambiente, porém,
possivelmente, o uso mais conhecido de perfumes e flores foi o sedutor
tapete de pétalas de rosas de Cleópatra, que se diz que tinha 30 centímetros
de grossura.
As plantas aromáticas eram também usadas a nível doméstico: as
almofadas e os colchões eram cheios com pétalas de rosas, a que muitas
vezes se juntava estróbilos de lúpulo, tanto pelo seu efeito relaxante como
pela suavidade que criavam. O alecrim também era usado para tirar dores
de cabeça, sendo empregues as sumidades floridas de plantas aromáticas
debaixo das almofadas das crianças para terem sonos sossegados.
No Egipto entre 3000 e 2000 anos A.C., já se obtinham os óleos
essenciais de modo rudimentar. Os médicos dessa época já os utilizavam
para tratar os doentes, mas principalmente em práticas mágicas.
Os vinhos aromáticos eram usados pelos efeitos anestésicos. As
fumigações aromáticas já eram empregues para desinfectar e como
remédio. Infusões de gomo-óleo-resinas em óleos faziam parte de
unguentos usados com as mesmas finalidades.
Os gálbulos do zimbro e as cascas das caneleiras eram correntemente
usados depois de maceradas em óleos vegetais, sob a forma de unguentos
ou em vinho, após maceração neste.
Os sacerdotes egípcios já empregavam um método de extracção de
compostos aromáticos, depois aperfeiçoado em França e denominado
enfleurage, que consistia em saturar grãos de sementes de sésamo com o
odor de pétalas e plantas aromáticas. De notar que esta técnica, ainda hoje,
é usada em algumas regiões da Índia.
Os Egípcios deram uma atenção especial aos óleos essenciais,
utilizando-os na sua vida diária com fins curativos, em cosméticos e
também a par de outros produtos aromáticos.
Um dos perfumes, mais usado, era o Kyphi, uma mistura de dezasseis
diferentes óleos essenciais, normalmente usado em cerimónias religiosas.
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Plutarco (45-120 ?), filósofo e prosador grego do período greco-romano,
escreveu que “O cheiro deste perfume penetra no corpo pelo nariz. Faz-nos
sentir bem e relaxados, a mente divaga e sentimo-nos num estado sonhador
de felicidade como estivéssemos a escutar uma música deliciosa”. O Kyphi,
ao contrário das drogas depressoras, provoca no indivíduo uma acção
estimulante e consciente. Por este motivo, os sacerdotes e os faraós
inalavam-no, frequentemente, quando estavam em meditação, estando esta
prática registada em muitas inscrições. Cada faraó e sua família tinham um
número diferente de perfumes para serem usados consoante o momento do
dia e para ocasiões especiais. Por exemplo havia um perfume para a guerra
que estimularia sentimentos agressivos, enquanto outro era para a
meditação ao provocar tranquilidade e introspecção.
O lótus, com uma flor de odor agradável, crescendo em abundância
nas margens do Nilo, tornou-se a flor sagrada do Egipto. Outras flores,
como a orquídea azul, eram importadas de diversos países, alguns bem
distantes como a Índia e China. Isto deu origem a um importante comércio
que se intensificou no reinado da rainha Hatshepsut (provavelmente no
período entre 1490 e 1468 A.C), a única mulher faraó. Com efeito, ela
adorava os perfumes e incentivou o uso dos cosméticos e a intensa
maquilhagem dos olhos.
Normalmente centenas de toneladas de plantas aromáticas eram
transformadas em perfumes, principalmente óleos perfumados que eram
queimados nos templos. Cada deus e cada deusa tinha o seu próprio
perfume; a artemísia para Ísis, marroio para Horus, manjerona para Osíris e
quando os faraós queriam alcançar algum favor ou agradecer-lhes pelos
bons resultados de uma guerra, queimavam esses óleos em seu louvor.
Também é de assinalar o uso que faziam das plantas aromáticas na
cozinha. Adicionavam alcaravia, coentros e anis ao pão de painço e cevada
para o tornar mais agradável e de melhor digestão. A hortelã, a manjerona e
a salsa eram largamente usadas. A cebola entrava em grande quantidade na
alimentação. O alho era muito usado para evitar as doenças e afastar as
epidemias. A tradução de uma inscrição na pirâmide de Queóps, construída
cerca de 4500 anos A.C., refere que todas as manhãs cada escravo
trabalhando na construção civil recebia do seu senhor uma cabeça de alho
para lhe dar força e boa saúde.
Foram exímios na arte do embalsamamento no qual usavam
especiarias como o cravinho, a canela e a noz-moscada, também a mirra, o
incenso, o gálbano e outras resinas aromáticas na mumificação dos mortos,
com vista à sua preservação para a eternidade. Vestígios desses produtos
aromáticos já foram identificados nas ligaduras das múmias.
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Na Mesopotâmia, região compreendida entre os rios Tigre e Eufrates,
no Oriente Médio, desde o Neolítico se desenvolveram várias civilizações
(sumérica, assírica e babilónica) que assentavam ser o homem criado pelo
deus Marduk, que seria, com outros deuses, responsável pelo bem-estar do
homem e, por tanto, pela sua saúde ou doença. Os deuses estavam
acompanhados de génios do bem ou do mal que directamente intervinham
conforme a sua influência na saúde ou na doença. Uma desobediência a uma
regra instituída podia atrair os génios do mal, mas também os feiticeiros
com determinados ritos e exorcismos teriam capacidade de originar, para
uma pessoa saudável, a doença.
Nestas civilizações, embora já a cirurgia fosse praticada, o
curandeiro-feiticeiro, já com características sacerdotais nítidas, usa
numerosos produtos naturais onde predominam as plantas, mas sempre com
ritos mágicos, pois sem estes, elas não actuariam.
Consideram-se como primeiros documentos escritos, por ordem do
rei assírio Ashurbanipal, dados das civilizações suméricas e babilónicas, que
nos dão a conhecer o modo como era a terapêutica desse tempo. As
inscrições em caracteres cuneiformes gravadas em várias placas de barro,
datando algumas mais de 3000 anos antes da era cristã, encontram-se
conservadas, actualmente, no “British Museum” de Londres. Nessas placas
existem grande número de informações, muitas delas escritas por ordem do
referido rei assírio, sobre as plantas medicinais e aromáticas usadas
(açafrão, heléboro, ópio, rícino, linho, mandrágora, etc.) e também sobre a
sua cultura e transformação em medicamentos à custa de certas operações
farmacêuticas ainda hoje empregues (expressão, filtração, maceração,
digestão) conducentes a formas farmacêuticas tais como pomadas,
unguentos, emplastros e pílulas.
De referir que no conhecido Código de Hamurabi, do rei babilónico
que reinou de 1728 A.C. até à sua morte em 1.686 A.C., contendo
essencialmente legislação, há referências a muitos fármacos vegetais como
o ópio, o meimendro, o gálbano, a assafétida, e outras plantas aromáticas.
Esse Código está inscrito num monólito, em três alfabetos distintos, hoje
exposto no Museu do Louvre, em Paris.
Entre 1974 e 1975 foi descoberta a biblioteca do palácio real de Ebla
(Síria) com cerca de 20.000 placas de argila, muitas das quais com
informação sobre o emprego de plantas em tratamentos usados nessa época.
São os Persas considerados como os inventores de um aparelho de
destilação, que segundo Avicena, Ibn Sina seria o primeiro a obter um óleo
essencial puro a partir da Rosa centifolia. Sendo este investigador
denominado, mais tarde, como o “Príncipe dos médicos”, pois escreveu
mais de cem obras médicas onde são feitas referências a numerosas plantas
aromáticas.
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Os Hebreus empregavam as plantas aromáticas principalmente nas
cerimónias religiosas. Na Bíblia encontram-se inúmeras referências de
plantas usadas como medicamento, de entre as quais se destacava o
hissopo, que devido à pinocanfona teria uma acção mucolítica. Este, era
considerado como uma planta aromática miraculosa e purificadora, a par do
ouregão sírio (Origanum syriacum carvacroliferum).
3 - CIVILIZAÇÕES GREGA E ROMANA
Em relação a civilizações mais recentes, um contributo importante é
dado pelos povos helénicos, que não só receberam dos persas muitos
produtos aromáticos, como tiveram grandes médicos como Hipócrates
(460-370 A.C.), considerado o ”Pai da Medicina”. Este, nos livros
“Aforismos” que lhe são atribuídos, indica o interesse dos banhos
aromáticos com anis, cominhos, incenso, mirra, tomilho, etc, no tratamento
de doenças da mulher.
Os Gregos foram os maiores consumidores de produtos odoríferos
naturais, tendo sido escritas inúmeras obras, onde não só eram descritas as
propriedades, como havia indicações sobre os melhores locais onde se
podiam obter essas plantas.
Galeno, a quem se ficou devendo algumas das formas farmacêuticas
precursoras das que ainda hoje são usadas, e Teofrasto, que com a sua obra
“História das plantas”, deixa descrições botânicas muito precisas,
acompanhadas de indicações sobre efeitos tóxicos e propriedades curativas
foram importantes para a terapêutica. Teofrasto no livro “Tratado dos
odores” desenvolve o valor terapêutico dos perfumes, fazendo
considerações sobre o tipo de perfume que melhor se coadunava para
embelezar uma dada parte do corpo da mulher. Contudo, quem
posteriormente se destaca no campo das plantas medicinais e aromáticas é
Pedanius Dioscórides (40-90 da era cristã), que, ao acompanhar os
exércitos romanos na Península Ibérica, no Norte de África e na Síria,
recolhe abundante informação sobre plantas dessas regiões. Escreve o
tratado “De Materia Medica” que representa um marco histórico no
conhecimento de numerosos fármacos, muitos dos quais ainda hoje são
usados. Nele, se descrevem cerca de 600 produtos de origem vegetal,
animal e mineral, com indicações sobre o seu uso médico. Foi tal a
projecção da obra de Dioscórides que, tendo sido escrita no ano 78 da
nossa era, passa a ser usada, como guia de ensino, no mundo romano e no
árabe, continuando em vigor até finais da Idade Média, pois ainda no
século XV, são feitas cópias em latim dessa obra.
Plínio, no livro XIII da sua “História natural” descreve,
essencialmente, vegetais produtores de óleos essenciais.
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Em Atenas, na luta contra as epidemias, queimavam-se várias plantas
aromáticas, tais como a alfazema, o alecrim, o hissopo e certamente muitas
outras.
Uma outra característica dos gregos foi o uso de óleos aromatizados
que eram aplicados em massagens conforme o fim em vista (acção
estimulante, sedativa, etc.).
Os Romanos beneficiaram muito dos conhecimentos gregos quanto à
aplicação dos perfumes e dos óleos aromatizados que normalmente eram
aplicados após o banho.
Acreditavam nas virtudes dos banhos aromatizados com plantas, que
usavam para restaurar o vigor sexual e diminuir os efeitos do vinho tomado
em excesso.
Três séculos após Hipócrates, Asclépiade, amigo íntimo de Cícero,
estava usa um novo método de tratamento, associando à massagem
aromática a música como adjuvante dessa terapêutica.
4 - CIVILIZAÇÃO ÁRABE
Os Árabes interessaram-se muito pela química, tendo desenvolvido,
muito especialmente, a destilação das plantas aromáticas. Ainda há poucos
anos em Portugal se usava o alambique em cobre, de origem árabe, na
destilação dos mostos vinícolas.
Os Árabes ao dominarem, a partir do século VIII, o comércio do
oceano Índico e os caminhos das caravanas provenientes da Índia e da
África, tiveram acesso a muitas das plantas dessas regiões, tais como o
ruibarbo, a canforeira, o sândalo, a noz moscada, o tamarindo e o cravinho.
Ilustração árabe sobre a preparação de medicamentos
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Um dos escritores árabes que veio a ter maior influência na sua
época foi Avicena (980-1037) ao escrever o “Cânon”, uma compilação
anotada dos livros de Galeno. A sua obra é metódica e clara, vindo a ser
seguida pela medicina bizantina, árabe, judia e latina mediaval.
De destacar, no século XIII, o célebre médico árabe Ibn Al Baitar,
de Granada, que na sua enciclopédia médico-botânica “Corpus simplicium
medicamentarium” incorpora os conhecimentos clássicos e a experiência
árabe, caracterizando mais de 2000 produtos, dos quais cerca de 1700 são
de origem vegetal.
5 – IDADE MÉDIA E RENASCIMENTO
A Idade Média é uma época caracterizada pela preparação de modo
misterioso de unguentos maravilhosos por meio de fórmulas mágicas.
Eram considerados como produtos vegetais mágicos, de entre outros. as
plantas aromáticas a arruda e até o alho. É de salientar o esforço exercido,
em prol da saúde, pelas Ordens Religiosas, pois muitos dos seus membros
utilizavam, criteriosamente, os conhecimentos greco-latinos sobre o
emprego das plantas medicinais, que cultivavam junto aos mosteiros.
Efectivamente houve, por parte das Ordens Religiosas, um esforço enorme
na tradução para o latim de muitíssimas obras árabes de medicina até ao
século XIII. Igual interesse foi posto na tradução das obras de Hipócrates e
de Galeno para o latim.
Oficina de Farmácia na Idade Média
De destacar o ensino de medicina feito no Mosteiro de Santa Cruz
em Coimbra. Nele se forma S Frei Gil de Santarém (1115 ou 1187-1265) a
quem se atribui um receituário que incluía muitas plantas aromáticas
(arruda, funcho, losna etc.). Pelo Mosteiro passa Pedro Julião (1205-1277)
que depois estuda em Paris onde é conhecido por Pedro Hispano, médico
notável que ascendeu ao papado com o nome de João XXI e a quem se
atribui a obra “Thesaurus Pauperum” onde são referidas muitas plantas
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aromáticas orientais tais como o cálamo-aromático, o cravinho, o gengibre,
a canela, a noz-moscada, o sândalo, a zedoária, entre outras.
Com o Renascimento, o charlatanismo e o empirismo da medicina e
da farmácia da Idade Média, cedem lugar, pouco a pouco, à
experimentação, ao mesmo tempo que vão sendo introduzidos na
terapêutica novos fármacos, com a chegada dos nossos antepassados à
África, à Índia e ao Brasil e, dos espanhóis, aos outros países da América
do Sul.
É certo que a divulgação desses fármacos foi lenta, embora toda a
Europa estivesse ansiosa de os conhecer melhor. Nesse sentido, o
contributo dos portugueses foi notável, pela variedade e abundância de
informação que divulgaram.
Nas naus seguiam muitas vezes físicos (médicos) e boticários a quem
se ficou devendo muita dessa informação. Infelizmente, esta, ao ser
considerada segredo de Estado, não era divulgada. Isto aconteceu com o
boticário Tomé Pires, que tendo sido enviado à Índia em 1511, como
“feitor e veador das drogarias”, remete uma carta, em 27 de Janeiro de
1516, ao rei D. Manuel I, onde relata a origem geográfica e as aplicações
de muitas drogas usadas nessas paragens, mas que só trezentos anos depois
foi conhecida.
Nesta época, quem, destacadamente, se notabilizou foi Garcia de
Orta, que depois de ter permanecido na Índia mais de trinta anos, imprime
em Goa, em 1563, os “Coloquios dos simples, e drogas he cousas
mediçinais da Índia, e assi dalguas frutas achadas nella onde se tratam
alguas cousas tocantes amedicina, pratica, e outras cousas boas, pêra
saber ”. Livro escrito em forma de diálogo entre o Doutor Ruano, que
simboliza o médico da época e o Doutor Orta, no qual Garcia de Orta põe a
sua própria opinião apoiada na observação e na sua experiência pessoal,
esclarecendo certos pontos polémicos de obras anteriormente publicadas,
corrigindo e dando mesmo indicações, com invulgar exactidão, sobre certos
fármacos até aí nunca descritos.
A divulgação dos “Colóquios” de Garcia de Orta acaba por ser feita
pelo notável botânico francês Charles de l´Écluse, também conhecido por
Clúsio, que numa versão mais resumida, em latim, torna aquela obra
acessível a toda a Europa culta dessa época. Posteriormente, em 1581,
quando se encontrava em Inglaterra, Clúsio conhece o “Tractado de las
Drogas y Medicinas de las Índias Orientales”, publicado pelo português
Cristóvão da Costa e que ele, igualmente, acaba por traduzir para latim e
publicar, pela primeira vez, em 1582.
Não se limitaram, evidentemente, à flora da África e da Índia, as
contribuições numerosas que os portugueses trouxeram para o
conhecimento dos fármacos. De destacar, também, a que foi dada ainda no
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século XVI pelos Jesuítas, na divulgação dos medicamentos usados pelas
populações indígenas do Brasil. Por exemplo, o padre José de Anchieta
refere as propriedades anti-sépticas e cicatrizantes do bálsamo copaíba.
A partir da publicação, em 1673, da “Histoire géneral des Drogues”
pelo farmacêutico Pierre Pomet, as Universidades encorajam o estudo das
plantas medicinais e das aromáticas, através da criação de jardins
botânicos, alguns dos quais destinados, exclusivamente, à cultura de
plantas para aplicação no tratamento de doenças.
Depois deste período, outras plantas e produtos medicinais exóticos
aparecem na Europa. Por exemplo, dentro das aromáticas, a baunilha,
descoberta pelos espanhóis no México, só apenas em 1721 é incluída na
“London Farmacopeia”.
No entanto, nos finais do século XVIII, entra-se num novo período
do conhecimento com o isolamento dos constituintes das plantas. Foram os
trabalhos do sueco Scheele (1742-1786) que deram início a esta nova etapa,
ao isolar, de plantas aromáticas, a cânfora e o timol, na sua farmácia de
Koping.
6 - EVOLUÇÃO NOS TEMPOS MODERNOS
A caracterização botânica das espécies vegetais com actividade
farmacológica e o estudo da sua composição química com isolamento,
identificação e dosagem dos seus constituintes é uma das características da
fitoquímica moderna.
A correcta caracterização botânica de uma planta continua a ser
fundamental, pois sem esta não há estudos químicos e fisiológicos válidos
para a espécie vegetal em estudo. As plantas aromáticas nas últimas
décadas têm sido submetidas a intensos estudos químicos e farmacológicos,
que deram a conhecer ou a confirmar a sua actividade, ou a de alguns dos
seus constituintes.
O desenvolvimento da química analítica, designadamente, através
dos modernos métodos cromatográficos, espectrométricos, e
radioimunológicos, apoiados em aparelhos cada vez mais sofisticados, tem
permitido um melhor conhecimento da composição química das plantas
aromáticas e da estrutura dos seus componentes activos.
Consequentemente, hoje há um maior controlo na qualidade, com uma
intervenção mais precisa nos aspectos relacionados com a sua obtenção,
cultura, colheita, preparação e armazenagem e também, sobre os processos
industriais que envolvem o isolamento dos seus compostos activos.
Nos últimos quarenta anos, graças aos progressos alcançados nos
métodos analíticos, os conhecimentos sobre as plantas aromáticas foram
consideravelmente aumentados. Bastará consultar as revistas da
especialidade, para nos apercebermos do elevado número de novos
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constituintes isolados, dos estudos farmacológicos e das referências aos
mecanismos que envolvem a bioformação desses constituintes no vegetal.
Mesmo tendo em conta toda a investigação até agora realizada, esta
acaba por ser uma pequena parte do que, até ao momento, ainda está por
fazer, já que é grande o número de plantas aromáticas ainda não estudadas,
tanto no sentido de uma utilização directa, como da obtenção de novos
constituintes activos, ou, muito simplesmente, de novas moléculas que
possam servir para preparar por semi-síntese compostos
farmacologicamente activos.
É certo que, a nível mundial, algumas das espécies ainda não
investigadas, química e farmacologicamente, pertencem ao arsenal
fitoterapêutico, que o homem utilizou, muitas vezes, com bons resultados.
Tais medicamentos de uso popular variam, como é lógico, de acordo com a
flora existente numa determinada região climática, e cujo estudo é possível
fazer-se, ainda hoje, nas sociedades contemporâneas mais ou menos
primitivas. Tem de se pensar, que essas colecções de plantas aromáticas
tradicionalmente experimentadas no homem, hão-de conter seguramente,
algum aspecto digno de posterior investigação, não devendo, por isso,
serem postas de lado como inúteis.
A ocidentalização de muitas destas populações e o risco eminente da
perda total de tais conhecimentos empíricos, conferem ao seu registo o
estatuto de necessidade urgente. Veja-se o que se está a passar em diversas
regiões do globo, onde a rápida mudança do modo de vida de sociedades
rurais está a fazer desaparecer a sua medicina popular, que se apoia, quase
sempre, em floras muito importantes.
Países como a China, a Coreia do Norte, o Japão e países africanos,
têm feito um esforço significativo, na investigação de plantas de uso
tradicional, o que tem conduzido a resultados de alto interesse sob o ponto
de vista terapêutico e evitado a perda dessa informação.
Por outro lado, a forma alarmante como se processa, em certas
regiões, o extermínio de espécies vegetais, mesmo antes de serem
investigadas química e farmacologicamente, justifica que se conceda
prioridade a tais estudos. Vários investigadores têm feito importantes
revisões sobre o uso medicinal e efeitos tóxicos de plantas, por populações
não ocidentalizadas.
Ainda que a medicina ocidental esteja, essencialmente, orientada
para o sistema alopático, há outros métodos terapêuticos, de importância
mundial, que empregam também plantas aromáticas no tratamento das
doenças. Na maior parte dos casos, a filosofia geral em que os ditos
sistemas se baseiam, difere, significativamente, do alopático, ao fazerem
apêlo a outros efeitos não considerados na medicina clássica. É um facto
indiscutível o interesse que o mundo ocidental, principalmente nas últimas
décadas, tem vindo a mostrar pelo uso das plantas aromáticas, dos
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respectivos extractos na terapêutica e dos óleos essenciais, constituindo, em
certas circunstâncias, uma ajuda nos cuidados primários de saúde e um
excelente complemento terapêutico, compatível com a medicina clássica.
No caso dos óleos essenciais a sua utilização tanto por via externa como
interna tem vindo a aumentar, constituindo hoje a aromaterapia um ramo da
terapêutica em desenvolvimento.
O incremento que nas últimas décadas os medicamentos com plantas
aromáticas ou com os seus óleos essenciais tiveram, foi fruto de uma
investigação cada vez maior. Esta garante, para além da qualidade dos
produtos usados e do modo de preparação do medicamento, a segurança
em relação a efeitos tóxicos, o conhecimentos de efeitos secundários, de
interacções, de contra-indicações, da mutagenidade, etc. e, também, a
existência de ensaios farmacológicos e experimentação clínica que
demonstrem eficácia para este tipo de medicamentos.
Capítulo do livro “Plantas Aromáticas em Portugal – Caracterização e
Utilizações”
A. Proença da Cunha, José Alves Ribeiro e Odete Rodrigues Roque
Ed. Fundação Calouste Gulbenkian - Lisboa (2007).
http://antoniopcunha.com.sapo.pt
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